sábado, 9 de abril de 2011

Forcado Símbolo de Portuguesismo

Fruto do desejo de auto-afirmação inerente a toda juventude a "pega", é uma autêntica fábrica de heróis desajustados no tempo. Intérpretes de um antigo ritual que dificilmente se adapta ao mundo actual.



De uma forma abstracta, sem mesmo ter consciência da transcendência do seu gesto, o Forcado, encarna as qualidades lusas, o gosto pela aventura e pelo perigo, a temeridade, imaginação e o sonho, que instigaram os portugueses de outrora a meterem-se mar dentro em frágeis caravelas, à procura de novos mundos. O toiro é, para o Forcado, o gigante Adamastor que é preciso vencer. É o poder que ele desafia e procura dominar.



Enfrentar um toiro, representa pois, um corajoso e violento acto de rebeldia e audácia."



Provocar o risco até à possibilidade da morte, buscando emoções fortes. Sentir-se perto dos cornos do toiro, é uma experiência que, depois de concretizada, dá lugar a sentimentos de euforia, omnipotência, e satisfação pessoal difíceis de descrever e, por vezes, de controlar. Pegar toiros tornou-se para muitos jovens portugueses, um ritual de iniciação.



Até meados de 1970, com carácter permanente, o número de grupos de forcados existente, estava muito longe do atual. A dificuldade residia em encontrar quem tivesse disposição para pegar o tipo de toiros que saiam - de arranque tardio, trajetória curta e defeituosa, embate incerto. Daí haver dificuldade em conseguir arregimentar os oito que tradicionalmente entram numa pega de caras.



Se bem que hoje em dia, por vezes, já não se respeite essa tradição. Se há problema, saltam a ajudar, os "excedentários" (elementos não pertencentes aos oito iniciais).



PERDEU-SE EM PUREZA E ESPONTANEIDADE O QUE SE GANHOU EM ARTE E PRESUNÇÃO



Posso dizer que sou quase do início da implantação do Forcado, o elemento mais singular e identificador do nosso espectáculo tauromáquico.



Acompanhei mais de perto o aparecimento do Forcado Amador. Pelo menos desde que tomou o carácter de continuidade que hoje tem. É pois um assunto em que me sinto à vontade para exteriorizar as minhas opiniões.



A pega de toiros começou a ser praticada de modo, digamos, artesanal e voluntário, por impulso, pelos moços de lavoura que acompanhavam os “Senhores” quando estes iam lidar toiros. Para os auxiliar e defender, levavam a espécie de cajado que utilizavam nas suas fainas agrícolas, a que davam o nome de forcado.



Não tendo cavalos mas com a mesma apetência pelo perigo que carateriza os portugueses e de que a nossa História é pródiga um dia, pediram aos patrões se podiam enfrentar os toiros a corpo limpo. Possivelmente por duvidarem que os seus subordinados tivessem êxito em tão temerária pretensão, o pedido foi aceite.



A sua audácia começou a dar nas vistas e o que tinha sido motivado por um desejo de auto valorização e experimentação passou a ser, também, uma fonte de rendimento pois após as suas actuações, pediam à assistência que os compensasse. Nascia assim o forcado profissional.



Ganharam popularidade, tornaram-se imprescindíveis. Em todos os espectáculos o público pedia “os homens do forcado”. Tal protagonismo não agradou aos seus amos.



Vendo o seu prestígio ameaçado, resolveram mostrar serem capazes de fazerem o mesmo que os seus subordinados e sem pedir nada em troca.

Todavia não era fácil formar um grupo com carácter permanente.



Buscando entre a fidalguia e burguesia boémia, iam-se conseguindo elementos para formar grupos ocasionais, que atuavam de forma esporádica. Começou assim o Forcado Amador. Porém não pegavam toiros de todas as ganadarias. As mais ásperas continuaram a ser para os profissionais. Só após o aparecimento de um grupo amador (o de Lisboa) a pegar toiros de qualquer ganadaria, a situação se modificou. Os outros grupos amadores não tardaram a seguir-lhe o exemplo. O que apressou o fim do Forcado Profissional.



O nivelamento das classes sociais que as mudanças que a sociedade foi sofrendo, proporcionou, igualmente contribuiu para esse desfecho.



Passando a não escolher ganadarias, pegando com mais arte e espetáculo, e com uma aceitação social diferente, os grupos amadores acabaram por aglutinar todos os forcados existentes. Passaram a ser todos forcados amadores. Deixou de haver Forcados Profissionais.



Também contribuiu para isso o fraco pago que os profissionais recebiam pelo seu “trabalho” – “entre aspas porque na verdade era a aficion ao perigo que os motivava. Não o dinheiro. Lê-se no TOUREIO NACIONAL de 9/6/918:”CONHECEIS ALGUM FORCADO RICO PELA PROFISSÃO…? Evidentemente que não. Conheceis somente, na sua maioria, homens inutilizados, morrendo lentamente devido aos estragos internos, e sempre na maior miséria”



Lembro Zé da Vila a tomar conta das portas dos curros em Vila Franca de Xira; Matias Leiteiro porteiro da Churrasqueira do Campo Grande; PÉ de Xerim, grande nome dos Forcados de Alcochete, no Campo Pequeno a vender cautelas. Também recordo a delicada atitude de D. Fernando de Mascarenhas, FIDALGO de raiz, maneiras e sentimentos,a oferecer a pega ao humilde cauteleiro.



Esta pequena dissertação só para se poder avaliar melhor a evolução positiva que o forcado teve e o declínio que vão sofrendo os seus valores tradicionais. A perda de alguns deles.



FORCADO AMADOR, na minha ótica, é aquele que não tira qualquer proveito do seu acto. O que verdadeiramente lhe interessa é sentir-se bem consigo próprio. Verificar que consegue fazer sem qualquer estímulo do exterior ou ideia de compensação, o que muitos só fazem a troco de dinheiro ou para, de algum modo, tirar partido.



PEGADOR DE TOIROS, é o que veste a farda de forcado, para alcançar objectivos: sair do anonimato; ir de um viver cinzento para a ribalta; para não ficar atrás dos amigos; porque se tornou moda; por a prática de tal modalidade, ser propiciadora de bons contactos sociais. Inclusive para conseguir um bom casamento.



Ora a internet, se aos primeiros não trouxe qualquer benefício especial, já para os segundos, foi a muleta ideal para conseguirem a visibilidade que não conseguiram como forcados.



Dá-lhes oportunidade de multiplicar e ampliar os feitos que tenham realizado. Por vezes, para compensar a falta de “material”, são exibidos separadamente aspetos diferentes da mesma pega, dando assim ideia de serem várias pegas e não apenas uma.



Depois, “forcados”/cibernautas, aproveitam as possibilidades que a internet lhes dá, para fazerem críticas e elogios aos que atuam. Alguns com comportamento muito superior ao que eles tiveram quando andaram a fazer o mesmo.



Com o pretexto de disciplinarem e valorizarem o Forcado, formam associações. Até uma que pretende ser a que manda nas outras todas. Para a perceção que tenho, estas intenções significam coartar o que está na génese do Forcado e fez com que fosse classificado de romântico.



É verdade que, pondo de lado o aproveitamento pessoal que proporcionam a alguns, a existência dessas associações (à parte a “Big Brother” que, sempre ao lado dos grupos mais credenciados, só tem servido para criar problemas aos que o são menos) são benéficas para o bom desempenho dos Forcados. Pega-se hoje com uma correcção que não existia há quarenta ou cinquenta anos atrás. De uma forma geral toiros muito menos arrobados mas, em contrapartida, com “gatos na barriga” como se diz na gíria taurina.



O convívio entre os elementos do grupo, a troca de impressões, a amizade que se estabelece entre eles, os treinos (coisa que no G.F.A. de Lisboa do meu tempo, não havia) reflectem-se depois positivamente na pega.



Concluindo: a actuação do FORCADO ganhou em beleza e arte. A do Pegador de Toiros em presunção. Mas perdeu-se a pureza, a simplicidade o “non sense” que caracterizava o Forcado de outros tempos. O que só poderá interessar aos saudosistas. Já o António Mourão, na sua canção, bem se fartou de pedir para o tempo voltar para trás e nada conseguiu.
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