Paulo Pessoa de Carvalho começou esta temporada dando uma pedrada no charco com a realização do Fórum do Mundo Rural e ao apresentar a marca Toiros & Cultura, nova chancela da sua actividade profissional. Ao chegarmos ao final da temporada fomos entrevistar o empresário que leva as praças das Caldas, Sobral e Cartaxo e que este ano realizou também várias corridas em praças desmontáveis ao mesmo tempo que apoderou diversos toureiros.
Tauromania – No início do ano apostou forte no lançamento da Toiros & Cultura, com o Fórum do Mundo Rural, no Plaza Ribeiro Telles, agora que esta a acabar o ano, qual é o balanço que faz da temporada?
Paulo Pessoa de Carvalho – O balanço não é aquele que eu esperava, foi um ano de muito trabalho e não tanto retorno.
A digressão do norte, por exemplo, uma aposta grande, mostrou-se muito trabalhosa, nalguns sítios claro investimento e noutros, atrevo-me a dizer, talvez uma perda de tempo. A certa altura da época cheguei até a dizer que seria o ultimo ano que eu andaria nos toiros a perder dinheiro. Na verdade a grande maioria dos empresários portugueses andam aqui porque são aficionados, porque se não fossem, eu estou convencido que não andavam cá. Isto não é encarado como um negócio puro que se dá dinheiro contínua, se não dá fecha a porta. Existe uma ilusão e uma paixão á volta disto que nos faz andar um bocadinho mais para a frente.
Na verdade foi um ano que, apesar de ter mais espectáculos e mais espectadores, teve que haver uma mexida grande nas bilheteiras e no caso das minhas organizações, houve um ajuste em baixa que fez com que não se reduzisse o número de espectadores, penso que nalguns casos até aumentou, mas reduziu-se receitas. No campo dos patrocínios também foi muito complicado, este ano houve muito menos dinheiro em apoios e patrocínios, houve portanto um conjunto de situações que não deixam o saldo ser aquele que se esperava ou que se gostava. Mas ainda vou cá estar em 2010, pelo menos, e aí perceber se é para continuar ou não.
T – Fale-nos agora dos Apoderamentos, levou alguns toureiros este ano, como é que foram as temporadas deles?
PPC – Os apoderamentos foi outra área que eu pensei desenvolver com alguma eficácia. Já levava o António Maria Brito Paes há 2 anos e este em 2009 fiquei a apoderar também a Ana Batista e o José Luis Gonçalves e ainda alguns praticantes e amadores.
Relativamente ao grau de satisfação para os objectivos propostos, no respeitante a cachets e número de corridas alcançámos a nossa meta, em particular com a Ana Batista e com o Brito Paes. O toureio a pé, foi para mim um falhanço, falhanço não pela capacidade de resposta do toureiro, para mim é o melhor toureiro português, mas porque o mercado não quer ver toureio a pé. Eu próprio andei a “inventar” corridas com toureio a pé para pôr o José Luis Gonçalves a tourear, o que não faz sentido nenhum. Para concluir, acho que em termos de objectivos com os toureiros, com excepção do José Luis Gonçalves, os mesmos foram claramente atingidos. No campo pessoal, esta ideia de criar uma estrutura, do apoderado não ser uma pessoa presente, não é fácil. O que eu percebi é que para o modelo de apoderado desejado, se calhar requer-se um bocado mais. Portanto eu vou reconsiderar o que se irá passar relativamente à temporada de 2010 relativamente a esta matéria.
T – E do ponto de vista artístico?
PPC – Do ponto de vista artístico houve resultados distintos. Eu, com toda a sinceridade, tinha maior expectativa relativamente ao resultado final. Acho que a Ana Batista correspondeu na generalidade. Acho que é claramente a melhor toureira que temos: tem classe, tem sítio, tem os cavalos bem-postos, é a única cavaleira que para mim tem um toureio sério. Se calhar podia ter sido ainda melhor ela como toureira e eu também podia ter estado melhor como apoderado mas atingiu as expectativas, diria que se atingiram bons resultados para o que se tinha projectado.
Quanto ao Brito Paes, acho que é um toureio com qualidade, está muito bem a cavalo, acabou o ano de 2008 em plena alta, não tendo o início desta temporada sido tão fulgurante, teve provas de fogo concretas e importantes: teve Évora, Campo Pequeno ainda em Maio… Na verdade o António Maria Brito Paes no principio da temporada tinha imensos contratos que não se mantiveram com igual frequência no seu desenrolar, isto reflecte de alguma forma o que se passa na praça. Houve muito contraste entre actuações boas com menos conseguidas e o que poderá ser de alguma forma mais preocupante, em jeito de critica, é por vezes a pouca transmissão ao público, do que de facto se passa relativamente à sua entrega em praça que tem que ser total …, o Brito Paes tem que trabalhar e melhorar esse campo. Eu tenho a consciência do seu empenho, mas isso tem que transpirar cá para fora, sabemos que não é com circo, não é com folclore, não é com números artísticos, mas é com um sentimento que tem que ser transmitido ao público com mais garra, com mais calor, qualidades essas que o toureiro tem e tem que as deixar transpirar!
T – Em relação às praças que leva, em especial as Caldas, Cartaxo e Sobral, como é que tem sido a evolução ao longo dos anos: em termos de empresa e em termos da resposta do público?
PPC – O Cartaxo, é a praça que tem sido mais difícil destas 3. As Caldas é um sucesso, que pode ainda ser melhorado. Penso que com as coisas boas e más que fiz, mas com a minha persistência e toda a envolvente que se deu à praça, as Caldas hoje é uma praça muito boa, e aqui digo sem falsas modéstias, que reconheço ser um mérito meu, com trabalho, com ajudas pontuais de gente que esteve ligada a mim, com o factor sorte, com coincidências, com tudo isso um pouco, mas de facto hoje as Caldas é uma praça que vale em termos financeiros, em termos de imagem, em termos de referência, em termos de preferência de cavaleiros e dos ganadeiros cá quererem vir. Para concluir também digo, a praça das Caldas está para mim como eu estou para ela, sou e serei a pessoa que melhor a poderá gerir!
O Sobral tem sido uma agradável surpresa. Tenho bons parceiros, nomeadamente a New Holland (Auto Agrícola Sobralense), através dos senhores Francisco e Pedro Penedo, meus grandes apoios e Amigos. O Sobral é uma praça cheia de potencial e com um encanto muito grande à sua volta, aliás tem uma Tertúlia que é muito viva e que promove a festa! Uma Tertúlia quando tem a dinâmica que esta tem, é logo um incentivo acrescido para qualquer empresário.
O caso do Cartaxo é mais uma ilusão. Como praça tem um problema muito grande que é ter Santarém (com os preços que sabemos) ali ao lado e também tem um histórico complicado. É uma praça que teve, anteriormente algumas gestões danosas. Depois esteve lá o Eng. José Gomes da Silva que iniciou um bom trabalho, com alguma ilusão de fazer recuperar a mística do Cartaxo mas não correu como ele queria. Nestes anos tenho tido uma estreita colaboração com a Câmara Municipal, embora a autarquia não tenha avaliado bem a questão relativa à adjudicação da praça, pois os contratos são anuais dificultando bastante a gestão da mesma. De qualquer maneira, tem sido um trabalho progressivo. Estou interessado em continuar com esta praça, e penso que tenho boas condições de com a autarquia desenvolver um trabalho sério, metódico, persistente, para continuar este projecto e encontrarmos em conjunto a receita mágica para o sucesso, é uma praça que pode após três anos de investimento, começar a produzir resultados em 2010, talvez…
T – As Caldas e o Cartaxo são duas praças que estão situadas no meio das respectivas localidades. Há projectos para remodelar as mesmas? Praças novas? Multiusos?
PPC – Nas Caldas a praça é privada e por isso esses projectos só poderiam ser feitos por decisão dos proprietários. Tendo eu a perfeita noção do potencial daquela praça, até era capaz de comprar a praça se me saísse o euromilhões! Mas não sendo o seu dono, nem sendo rico, o único projecto que poderia ter, seria fazer uma manga exterior para descarga dos toiros, pois a forma actual de descarregamento é arcaica, de uma emoção e perigo constantes. A praça das Caldas tem sofrido algumas benfeitorias, a meu ver curtas e ainda tem muito a fazer, mas a pouco e pouco têm sido efectuadas essas referidas benfeitorias, que têm na IGAC servido de exemplo para idênticas situações por esse país fora, isso também me serve de motivação, sei que de certa forma sou por tal responsável.
Relativamente à praça do Cartaxo, a mesma é capaz de sofrer algumas alterações. A Câmara tem projectos para os espaços envolventes, querendo fazer um centro de lazer, não vou adiantar mais porque na verdade não sei quais os projectos em concreto…
T – Sendo o Paulo Pessoa de Carvalho um dos principais dinamizadores da APET, como é que vê o papel da APET e deste tipo de organizações na defesa da festa?
PPC – A APET anda devagarinho, infelizmente, é muito, muito, mas mesmo muito difícil encontrar um consenso, mas mais difícil ainda é, apesar do consenso não ser atingido, sentir que se está a deixar de se fazer algum trabalho essencial para a imediata defesa dos nossos valores capitais, principalmente naqueles pontos em que não há dúvida que todos temos de estar de acordo. Na verdade alguns empresários associados não fazem e têm medo que os outros façam, e isso é muito complicado. Cada vez que temos uma assembleia-geral da APET, e eu posso confidenciar pois isto não faz mal que se saiba, podendo até ajudar a perceber o lento ritmo com que certas coisas andam, há vários sentimentos que nos vêm à cabeça. Em primeiro o sentimento de expectativa enorme, “será que hoje vamos dar um passo em frente?”, depois de repente, perante a realidade e os problemas criados há ali uma altura de desânimo e de perguntar “o que é que eu estou aqui a fazer?”, mas depois de “racharmos muita lenha” chegamos á conclusão que existe alguma luz ao fundo e saímos dali a achar que estamos no caminho da luz, mas que ele é longo…
Por fim a verdade é que na Festa e também no seio dos empresários há uma desmobilização grande que leva à desmotivação dos mais empreendedores. De facto são sempre poucos a puxar muitos, e os muitos não têm a consciência disso, parece que quase nos fazem um favor, ao deixarem-nos puxar pelas coisas. Portanto, há aqui também uma sensação de falta de reconhecimento e consciência do verdadeiro estado das coisas. Muitas vezes o que apetece é olhar exclusivamente para o Paulo Pessoa de Carvalho e para a Toiros & Cultura, e não querer saber da APET para nada, com toda a verdade e peço desculpa pela franqueza, se não fosse no intimo, por formação e convicção, penso que funcionava como autêntico free-lancer e sem ter preocupações colectivas!
Tudo é muito lento e a dificuldade da APET, assim como das outras Associações da Festa é que as pessoas não conseguem deixar as questões e os interesses pessoais de parte e isso limita a acção do conjunto. Mas eu acredito que a APET vai andar. Aliás, tem de andar! A APET juntou-se mais nesta fase, nas questões eminentes, como a questão da Plataforma essa também essencial na defesa e promoção da festa, estou também por isso, com uma esperança reforçada!
Não queria de todo deixar aqui um ar de negativismo ou de pessimismo, falei sobre este assunto de coração aberto, peço que leiam a mensagem positiva que aqui está e tenham maturidade de perceber que quando falamos, também temos que contar certas verdades e os problemas que sentimos, para de alguma maneira sermos compreendidos e até encontrarmos auto motivação para continuar, e ela às vezes falta …!
T – Não acha que para o aficionado tudo isso é um bocado incompreensível? O aficionado paga bilhete, suporta a Festa e depois não compreende como a Festa é tão pouco defendida pelos próprios profissionais?
PPC – Claro que o aficionado às vezes compreende pouco, é difícil compreender o quão pouco é feito… As empresas andam aqui, infelizmente, muitas vezes com projectos ao dia pois é difícil ter projectos de médio e longo prazo, e é um bocadinho esta incapacidade de haver uma projecção mais séria e a pensar no futuro que faz com que os empresários não sintam a necessidade de participar mais na APET, não sintam uma necessidade de combater os ataques que a Festa tem sido vítima por parte dos chamados “anti-taurinos”. A sensação que me dá é que os meus pares (na generalidade) não estão preocupados com o dia de amanhã… esta realidade é um bocado consequência de má cultura que temos enquanto povo, mas também se deve ao facto de muitos na Festa não encararem isto como actividade principal: toureiros, ganaderos, empresários.
É evidente que o aficionado, ao analisar as coisas, vai achar a menos as Empresas que operam e os Agentes da Festa que existem, sendo os Forcados um caso que considero à parte, pois têm um estatuto diferente e até são os mais activos e persuasivos na luta para as coisas seguirem em frente. Ora isto é a Antítese do que devia ser. Se as pessoas repararem em quem são os motores das coisas que acontecem na Festa Brava vêem que os forcados acabam por ter um papel de liderança que não lhes compete, isto sem desprimor algum para com os forcados. Não lhes compete porque deviam ser os que têm interesses financeiros e económicos a terem esse papel, eles é que vivem disto: os toureiros, os ganadeiros, as empresas, etc.
Claro que se o aficionado pensar nisto, deita as mãos á cabeça. Mas a mensagem que quero deixar aqui aos aficionados é que tenham paciência, mais ainda do que já tiveram, porque as coisas não são tão simples como às vezes parecem e pode ser que haja desenvolvimentos positivos e a bem da Festa nos próximos tempos.
T – A internet é hoje uma ferramenta importante na vida das empresas e das pessoas, às vezes não tanto na vida das empresas e pessoas da Festa, mas como é que analisa a Internet no dia-a-dia, como empresário e como apoderado?
PPC – No dia-a-dia, utilizo muito frequentemente a Internet, recorro ao computador por necessidade e acho que cada vez será mais importante. Mas tenho noção que ainda existe um grupo de pessoas resignado, que são renitentes com esta “nova” tecnologia, mas este grupo tende a diminuir a ao mesmo tempo aumenta o grupo das pessoas interessadas e que procuram informação variada na internet. Eu próprio no passado, dizia que a internet era o futuro mas não sabia avaliar o potencial. Hoje em dia recorro diariamente, e a primeira coisa que faço quando ligo o computador é ligar-me á Internet, acho fundamental. A net tem um papel muito importante nos dias que correm e terá um papel cada vez maior! Não digo que vou deixar de colar cartazes, mas já ando diariamente com uma “pen” no bolso, e mesmo quando vou para o campo tenho meios para ver um site, enviar um e-mail. Se calhar ainda estamos a 15% ou 20% do potencial da Internet na sua utilização. Nos toiros talvez menos ainda mas já começa a ter a sua força. Por exemplo, cada espectáculo meu tem um filme promocional no site Toiros & Cultura, o ano passado eu não tinha newsletter e este ano já faço o envio periódico da minha, envio regularmente para cerca de 1200/ 1300 contactos.
T – Estamos a que distancia, cá em Portugal, de termos toureiros e apoderados preocupados com a informação online em cima da hora como por exemplo faz o Pablo Hermozo cujo staff faz chegar fotografias e resumos das actuações menos de uma hora depois das mesmas terem acabado?
PPC – Estamos a uma distância abismal! Não existem Apoderados profissionais em Portugal para que isso aconteça. A questão desse cuidado tido pelo staff do Pablo é uma preocupação global de gestão que não existe em Portugal. Hoje, um toureiro, deve ser gerido como é gerida uma empresa e de facto essa gestão não existe cá. Nem eu, tão, pouco, cheguei perto disso. Investi, tive a ilusão dos sites, falhei em imensas coisas, mas depois uma pessoa começa a achar que não é percebido, que o seu trabalho não é reconhecido, que não atinge os objectivos. Esse grau de profissionalismo está a milhas… e não vamos ver tão depressa esse profissionalismo por cá, não faço mesmo ideia se acontecerá algum dia em Portugal esse tipo de forma de trabalhar “global”, tenho as minhas sérias dúvidas.
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