quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

"Falta profissionalismo à nossa Festa" - Entrevista ao empresário Paulo Pessoa de Carvalho

Neste inicio de ano fomos ao encontro do empresário Paulo Pessoa de Carvalho, que gere as praças das Caldas da Rainha, Cartaxo e Sobral além de organizar vários espectáculos por esse Portugal em praças desmontáveis. Numa conversa desasombrada Paulo Pessoa de Carvalho fez o seu balanço da temporada 2010 e falou-nos das expectativas para 2011.


Para esta entrevista pedimos também a ajuda dos nossos visitantes e, amanhã, na segunda parte desta entrevista, veremos as respostas de Paulo Pessoa de Carvalho às questões dos nossos visitantes. Vale a pena esta leitura.

"O ano de 2010, contrariamente ao que se esperava foi bom"

Tauromania (T) – Paulo, qual o balanço que fazes da temporada 2010 nas tuas praças?

Paulo Pessoa de Carvalho (PPC) – Penso que a temporada de 2010 foi melhor que a de 2009. Em termos gerais foi uma boa temporada com mais espectadores por espectáculo, o que é bom. Penso que da parte da generalidade dos empresários houve uma atenção aos preços, o que foi muito importante, e por isso foi um ano em que contrariamente ao que se previa numa fase inicial, acabou por correr bem.

T – E especificamente nas tuas Praças?

PPC – Nas minhas Praças sucedeu um fenómeno curioso: nas datas tradicionais as coisas não funcionaram tão bem mas nas organizações extra estas datas as coisas correram melhor. Para isto muito contribuíram as parcerias feitas com organizações que têm uma boa capacidade de mobilização. Estou a lembrar-me concretamente da Corrida do CDS que fizemos nas Caldas em Julho, numa data nova, e que encheu. Eu já tinha tentado no final dos anos 90 organizar corridas nesta data, até televisionadas, mas tive de parar porque não corria bem. Quero com isto dizer que esta corrida só correu bem em 2010 porque houve essa capacidade de mobilização que, no caso, o CDS trouxe.
Também em Maio, nas Festas da Cidade, realizei uma iniciativa com o Grupo das Caldas que resultou em cheio. Bilhetes a 5 €, preço único, e a Praça encheu completamente.
Foram organizações que provaram que com preços atractivos e capacidade de mobilização o sucesso é possível mesmo em datas não tradicionais.
No entanto, o 15 de Agosto foi mais fraco que o habitual.

T – E no Cartaxo, com duas datas tradicionais, o 1 de Maio e o 1 de Novembro?

PPC – No Cartaxo, foi mau. O Cartaxo é uma Praça na qual tenho investido tempo e dinheiro. Tenho a ilusão de que ali se possa fazer qualquer coisa mas todos os anos equaciono se deixo ou se continuo. Acho que se pode conseguir um muito melhor entrosamento com as forças vivas daquela região, incluindo com as empresas, mas tem de ser um trabalho de fundo. O Cartaxo é uma praça que se fosse a única eu não a poderia ter. Não sendo a única é uma praça na qual deposito esperanças mas estou muito na expectativa em relação ao que vai ser o Cartaxo em 2011.

T – E o Sobral?

PPC – O Sobral é uma Praça com aficionados, no entanto este ano em Setembro senti uma quebra na venda de bilhetes.

T – Achas que o Sobral “aguenta” duas corridas seguidas em Setembro? Antigamente apenas havia a de segunda-feira.

PPC – Isso é uma boa pergunta. Não sei… sinceramente não sei se aguenta. E há que reflectir. Essa pergunta que me fizeste também já a fiz a mim próprio mas ainda não tenho a resposta. Este ano vamos ter de pensar bem. Analisar se vale a pena fazer só uma muito forte… mas há que ter também em conta que os hábitos mudaram. A segunda-feira, que era a data forte no Sobral, não é feriado municipal e mesmo as pessoas do Sobral não trabalham na sua maioria no Sobral e por isso têm dificuldade em estar presentes. Muita coisa mudou. Se só houvesse corrida à segunda-feira talvez mais pessoas que vão no Domingo fossem à Segunda mas tenho a certeza que também na Segunda também perderíamos muitas que hoje em dia vão ao Domingo e não podem ir à Segunda.
Além disso o apoio que tenho no Sobral, da Auto Agrícola Sobralense, funciona muito bem e a corrida de Domingo acaba por ser um pouco a “festa” desta empresa.

T – Faz mais ou menos um ano fizemos-te uma entrevista como esta e disseste-nos que em 2010 irias apostar menos nas organizações em desmontáveis. Como correram as que organizaste e como vai ser em 2011 em relação a esta matéria?

PPC – Realmente fiz menos. Correram bem alguns projectos como Águeda e São João da Pesqueira, onde pretendo repetir. Correu mal Oliveira do Bairro, que realizava pelo terceiro ano seguido e que, em 2011, se não mudarem os contornos do negócio, não irei fazer. Celorico da Beira também foi uma corrida que não correspondeu pois não pagou o trabalho que se teve.
Assim, em 2011 irei manter a tendência de descida no número destas organizações como fiz no ano passado. Estou naturalmente disponível para que contratem o meu know-how para ajudar numa boa organização e promoção deste tipo de corridas, posso também pensar em parcerias. Mas eu como promotor puro de uma Corrida de Toiros numa Praça desmontável, isso fica na gaveta.

T – Mas isso tem a ver com este clima depressivo geral que está instalado ou com a falta de atractividade da Festa dos Toiros?

PPC – Tem muito mais a ver com esse clima depressivo do que com falta de atractividade da Festa. Na província as pessoas gostam imenso da Festa e compram bilhetes mas as coisas têm de ser bem divulgadas e promovidas e para isso é fundamental o papel dos parceiros nessas regiões que possam garantir esse trabalho e fazê-lo com eficácia. O espectáculo da tourada é uma Festa e sobretudo no Centro e no Norte as pessoas gostam muito, embora não tenham tradições taurinas têm uma relação muito forte com o cavalo e até com outros bovinos não bravos. Mas, como em tudo, tem que haver boa divulgação e uma dinâmica que só bons parceiros locais podem dar. E neste clima depressivo é muito mais difícil encontrar a disponibilidade desses parceiros locais, nomeadamente autarquias.

"A actividade de apoderado colide com a de empresário, com prejuizo desta última"

T – Também nessa entrevista de 2010 disseste que irias reduzir apoderamentos tendo apenas ficado a apoderar a Ana Batista. Já é sabido que em 2011 este apoderamento não continua. Fala-nos desta vertente da tua actividade: vai ficar parada?

PPC – A dupla vertente de empresário e apoderado é uma coisa muito normal na maior parte dos meus colegas e em Espanha também. É natural que quando estou a falar com um apoderado que também é empresário, sobre um toureiro que quero contratar, acabe também a falar do toureiro que apodero. No entanto são duas funções cujos interesses colidem muitas vezes e, na minha análise, colidem com prejuízo para a função de empresário que é aquela à qual eu mais devo prestar atenção, por isso decidi “congelar” a minha função de apoderado. Não digo que não o venha a ser novamente. Sei lá como será o dia de amanhã. Sei lá se me interessará continuar a ser empresário, ou se noutra fase me aparece um toureiro com um desafio irrecusável… não sei. Mas neste momento sei que não o vou ser.

T – Desta forma o Projecto Toiros & Cultura que apresentaste em 2009 fica um pouco “vazio”. Consideras isso uma falha? E porque falhou?

PPC – Olha, ainda bem que me colocas essa pergunta pois as pessoas podem achar que o Paulo Pessoa de Carvalho fez umas grandes apresentações, apareceu com um projecto com uma grande pompa e depois foi tudo fogo de vista.
Eu de facto tive a ilusão de que projecto Toiros & Cultura vingasse. Acho que este nosso mercado também gosta de novidades, gosta de novas abordagens, gosta até de coisas que aparecem com uma nova imagem, novos conceitos gráficos… gosta mas não valoriza, não transforma esse gosto em disponibilidade para investir.
Não quero ser nem injusto nem convencido ao dar-te esta resposta. Se calhar foi demasiado ambicioso, talvez um pouco “poeta” e romântico mas chego à conclusão que a nossa Festa não está preparada para sustentar este tipo de projectos.
No entanto o Projecto Toiros & Cultura não acabou. A minha actividade mantém-se. O que teve foi de ser adequado a uma realidade que não sustenta o projecto tal como ele foi idealizado no inicio.

"Falta profissionalismo à nossa Festa"

T – Tu que foste apoderado de vários toureiros poderás responder a esta questão: Os toureiros no orçamento que fazem anualmente, colocam uma verba para investir em promoção?

PPC – Não… fazem-se uns calendários e uns postais. Não se gasta mais dinheiro do que nisso.

T – E achas que os espanhóis, não só o Pablo e o Ventura, que investem em ter sites actualizados, gastam dinheiro em trazer fotógrafos com eles, em fazer vídeos das suas actuações, gastam dinheiro em publicidade em capas de revista e sites de noticias o fazem porque são mais românticos que os portugueses? Ou fazem-no porque isso os ajuda a colocar mais um zero no cheque que recebem como sucede quando actuam em Portugal em que o cheque deles tem sempre mais um zero que o cheque dos portugueses?

PPC – Fazem-no porque são profissionais. É outra realidade não só por causa da dimensão mas também por causa da forma como os espanhóis vêm a sua actividade. Cá não há profissionalismo. Os toureiros até podem ser grandes profissionais no que toca a trabalhar os seus cavalos e na sua preparação, mas em tudo o resto não são profissionais e por isso também não valorizam nem estão despertos para essas realidades e por isso acabam por não se promoverem e isto é um ciclo vicioso no qual também entram os empresários. Mas penso que têm de ser os toureiros os primeiros a quererem promover-se para meterem mais gente nas praças e ganharem mais dinheiro. Não há argumentos para discutir cachet com um toureiro que além de ser bom se promove bem para garantir que mete gente.

Esta entrevista continua amanhã com as respostas de Paulo Pessoa de Carvalho às perguntas dos nossos visitantes. Vamos poder ouvir falar da relação entre a escolha dos toiros e a vontade dos toureiros, o critério na escolha dos Grupos de Forcados, a Pró-Toiro, a actividade de Empresário Taurino e ainda a relação pessoal com o Grupo de Montemor e o Grupo das Caldas. Não perca amanhã na sua Tauromania.

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